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quarta-feira, 8 de maio de 2019

O Relógio mágico


O relógio mágico








Quando eu entrava naquela enorme casa, quase sem querer, o primeiro sítio onde me dirigia era para a enorme sala de estar, com vista para o jardim…
Numa das paredes, dessa sala, havia um relógio de parede entre fotografias de parentes que eu nunca tinha conhecido e de outros que habitavam na minha alma…
Bisavós, Avós e algumas tias e tios…Alguns deles eu sabia que ainda estavam ali comigo…Mesmo que só eu os sentisse!
Mas ali havia muito mais do que as memórias representadas por todas daquelas fotografias…

Quando eu ali entrava aquele relógio recuava no tempo e parava sempre num dos dias felizes que eu, ali naquela casa, tinha vivido…
Não era eu que escolhia o dia era ele…o relógio!
Por isso é que eu o chamava de…Relógio mágico!

Naquele dia, parou a…14 de Maio de 1972…

Eu, pronta na sala, com apenas oito anos, vestia o meu vestido cor de coral…com folhos nas mangas…. Os sapatos pretos de verniz eram os meus preferidos!

Era domingo…Um domingo de primavera! Aquele, maravilhoso, aroma do campo não se comparava a nada!

Ao domingo lá em casa não havia “nada”…à exceção do aroma a bolo de laranja que se intensificava à medida que ia cozendo…e das minhas secretas aventuras com o farrusco!

O relógio mágico marcava agora 10:08 e eu já pronta, para mais um dia de domingo, saí para o jardim à procura do farrusco …

O farrusco era o nosso cão! Não tinha Pedigree mas nunca precisou disso!

Eu quase sempre o pisava…Estava sempre, ali, na soleira à minha espera!

A cada manhã olhava-me fascinado como se eu fosse uma verdadeira Princesa…

Adorava-o!

Era tão peludo que eu quase não lhe via os olhos e quando o abraçava nunca, mas nunca, me cheirou a cão…

Quando ele olhava para mim daquela maneira eu já sabia o que lhe ia na alma…

Nós falava-mos com o olhar!

E era ali que tudo começava…A nossa corrida de domingo!
Instintivamente começava-mos a correr e com todas as nossas forças dava-mos uma volta aquela enorme casa!

Nunca um de nós ganhou ou perdeu aquela prova pois chegava-mos sempre ao mesmo tempo ao ponto de partida…Incrivelmente nem um segundo a mais ou a menos!

Ele e eu a ofegar como dois náufragos…estava-mos felizes!

Entretanto chegou a hora de almoço! E eu, apressada, enquanto com a mão limpava os sapatos para devolver o brilho ao verniz o farrusco encostava a sua cabeça às minhas pernas num gesto único de cumplicidade…

Iria-mos partilhar o trofeu… 

Bolo de laranja ao almoço!

Texto de : Alice costa

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